Ano Europeu do Património: O “sonho” (?) da celebração do 160.º aniversário da Ponte Pênsil da Trofa
Chegados a meados do século XVIII, e sendo já muito reduzida a importância da Ponte da Lagoncinha- pelo aumento do tráfego e devido à grande volta que o traçado da velha estrada romana obrigava- surge, então a utilização de Barca(s) para a travessia do rio Ave, (a várias centenas de metros a sul da referida ponte da Lagoncinha).
As primeiras notícias sobre a(s) Barca(s), surgem em 1837, logo após a formação do concelho de Santo Tirso. Em sessão da Câmara Municipal de 7 de Abril desse ano, era posta em praça a arrematação da cobrança da passagem da Barca da Trofa e do Barquinho de Chaves. Essa travessia fazia-se no sítio um pouco a montante do Vau (lugar de S. Tiago de Bougado), que veio, por tal facto, a ser conhecido como o lugar…da Barca. No início, talvez só uma, depois duas, por força do movimento que as exigia e finalmente três as barcas que asseguravam a travessia do rio e mantinham a ligação entre os dois troços de estrada Porto-Braga. A propósito, o abade de S. Tiago de Bougado, Dr. Tomás Barbosa Sousa Vieira, viria a responder ao inquérito para preparação do Dicionário Geográfico do Porto, referindo desta forma:”…A qual ponte (da Lagoncinha) há muitos anos a esta parte pouca serventia tem, e se carece muito de outra que se passar no dito rio Ave, no lugar da Barca da Trofa, que fica na freguesia de S. Martinho de Bougado, vizinha desta, aonde com grande trabalho e perigo de vida, tendo morrido algumas pessoas afogadas, se dá passagem em 3 barcas, ao correio e povo que vem de Lisboa, Porto e outras partes, fazendo esta estrada direita por esta freguesia…”
Após a ponte de Estreu…eis que finalmente, em 1858, surge a construção da “bela” Ponte Pênsil (da Barca) da Trofa….
As obras da ponte Pensil iniciaram-se em Outubro de 1853, tendo sido concluída e posta ao serviço do trânsito no ano de 1858, celebrando-se este ano de 2018 o 160º aniversário da sua edificação.
Napoleão de Sousa Marques, em” Cidade da Trofa-Duas comunidades , um só Povo”.refere a certo passo´…Sobre a novidade do desenho e estrutura desta formosa ponte pênsil e das suas dimensões, leia-se o que disseram os seus autores, os insignes engenheiros Garcês e Calheiros, num opúsculo:-Adoptamos a forma de torres, depois de muito pensar nas mais adequadas às colunas de suspensão e de combinarmos tal assunto com o sr. Engenheiro fiscal por parte do governo e directores da companhia:- vão da ponte, 85,38 m, determinada por conseguinte a flecha de cabos, que é de 6,567 m fixada fica em 7,567, a altura das mesmas colunas, igual àquela flecha. E mais, a do estrado da ponte, e a altura da primeira liga… Cada um dos cabos de suspensão tinha o comprimento de 133m e era formado por um conjunto de 355 fios, obrigando a sua execução a 12 dias de trabalho de um mestre arameiro, um contra-mestre, cinco oficiais e cinco serventes…”
Tinha 4 torreões que semelhavam torres de menagem.
José Augusto Vieira, no “Minho Pitoresco” refere-se à Ponte Pensil da Trofa “…a natureza parece teve o prazer em rodear dos mais belos encantos de paisagem, escolhendo entre os quadros formosíssimos do Ave, um que não desdourasse a concepção artística do homem para emoldurar esta jóia, por ela trabalhada”
O escritor Alberto Pimentel descreve , no seu estilo peculiar, uma viagem do Porto a Braga, em diligência:
“…Esta ponte (a pensil) desperta agradáveis recordações a todos quantos viajaram na antiga mala-posta d’aquela Companhia (a Viação Portuense), desde o Porto a Braga.
Partia-se do Porto às 11 horas da noite, saindo da rua Entre-Paredes e rodava-se pela Batalha e rua Santa Catarina até ganhar o largo de Aguardente, que era nesse tempo o limite povoado da cidade.
Depois entrava-se em pleno campo, sempre por entre arvoredo, fazendo-se a primeira paragem na Carriça, onde o Silva, um homem forte e ancho, sempre de jaqueta, chapéu redondo na cabeça, vendia aos passageiros uma água de castanhas, a ferver, convencionalmente denominada café.
Após breve demora, segue-se para a Trofa, onde a aparição da esbelta ponte do Ave era sempre saudada com alegria pelos viajantes, não só porque a luz da manhã começara a sorrir na paisagem, mas também porque se aproximava Vila Nova de Famalicão, onde uma nova paragem dava tempo a almoçar bifes e ovos.
Era certo que faltava ainda atravessar a Terra Negra, na freguesia de Ribeirão, concelho de Vila Nova(hoje Famalicão), lugar povoado de tradições sinistras de salteadores e assaltos, coisa que já se perdia na noite dos tempos, mas que não deixava de ser ainda um pesadelo para os passageiros mais tímidos, especialmente as senhoras…”
Tal como aconteceu com a ponte de Estreu, também o signo em que havia nascido a Ponte Pensil, não foi nada famoso. É que, segundo alguns técnicos da altura “ à elegância e beleza da obra” pareceu não corresponder “ à sua solidez”, a começar pelo piso, cuja segurança ia diminuindo na razão inversa do aumento do trânsito, E esta, de ano para ano, era o que se via!…” (José Pereira da Silva, em S. Martinho de Bougado “Esboço de uma Monografia”).
Muito perto da demolição desta ponte (em 1932), o Quinzenário “ Trofense” na sua edição de 8 de Março de 1931 “revoltava-se” contra a demolição “criminosa” que estaria prestes a acontecer, nestes termos:
“A interessante e conhecida ponte Pensil da Trofa parece estar condenada a ser substituída por outra em cimento armado. Lamenta-se que o camartelo demolidor venha roubar-nos uma obra monumental, que é o orgulho da nossa terra, porque a conhecida ponte Pensil da Trofa é única em Portugal e das maiores da Europa, no género. E sendo assim, porque não há-de ser isto um monumento nacional? Porque privar o País inteiro de uma obra tão exótica que todos contemplam e admiram?”
Será que haveria outras razões por detrás desta“demolição” e posterior demolição? Terá sido por “inveja” de alguns e o “aproveitamento” da situação da segurança por outros?
Segundo refere Napoleão de Sousa Marques na sua obra. Cidade da Trofa, Duas comunidades …um só povo. “… as pedras foram numeradas e codificadas para erguer, de novo em terras do Alto Minho, sobre o rio Vez, afluente do Lima”,… mas desconhece-se o paradeiro das ditas pedras, assim como da ponte restaurada…
E a nova ponte, de cimento armado, seria inaugurada em 1935…
E o “sonho” transformou-se em pesadelo. Ontem… como hoje, os trofenses parece estarem votados a lamentar-se “ad eternum” pela destruição de pedaços da sua História.
Fonte: onoticiasdatrofa