Não nos tomem por tolos

25/01/2017 0 Por Carlos Joaquim

Celso  Filipe

Celso Filipe | cfilipe@negocios.pt25 de Janeiro de 2017 às 00:01

A realidade é que ninguém quer contribuir para dissipar o nevoeiro cerrado que se criou em torno da Caixa.
As declarações de Fernando Faria de Oliveira e Carlos Santos Ferreira na comissão parlamentar de inquérito à Caixa Geral de Depósitos (CGD) vieram enfatizar aquilo que há muito é uma evidência: o banco só será pacificado quando se realizar e forem tornadas públicas as conclusões da auditoria forense, aprovada pela Assembleia da República a 20 de Julho de 2016, mas que ainda se encontra numa qualquer gaveta do Banco de Portugal.
Pelo caminho ficamos a saber que ninguém tem responsabilidades e pode-se presumir que as imparidades da CGD, que conduziram à inevitabilidade do aumento de capital, são filhas de pai incógnito e fruto da malfadada crise financeira.
Por exemplo, Fernando Faria de Oliveira, actual presidente da Associação Portuguesa de Bancos e líder da CGD entre 2008 e 2011, garantiu ontem na CPI que a gestão da instituição pública foi “servida ao longo dos anos por grandes profissionais, quer a nível do seu conselho de administração, quer da alta direcção e restantes quadros e colaboradores”. Ninguém duvida. Contudo, o que está em causa não é a honorabilidade dos “grandes profissionais”, mas sim eventuais decisões, questionáveis à luz das boas práticas.
Já Carlos Santos Ferreira, que foi presidente da CGD entre 2005 e 2008, questionado sobre o facto de o banco ter concedido financiamentos para a compra de acções do BCP, garantiu que todos eles “foram aprovados (…) de acordo com os procedimentos estabelecidos, ou pelo conselho alargado de crédito ou pelo conselho de crédito”, acrescentando que o financiamento para a aquisição de acções, com a garantia associada a serem as próprias acções, era legal e continua a sê-lo. “Não era exclusivo do banco público.” Claro que sim. Com um simples, mas enfático senão. Sendo um banco público, por questões prudenciais e de distanciamento numa guerra entre accionistas, a CGD devia, porventura, ter-se eximido de tomar parte dela. 
A realidade é que ninguém quer contribuir para dissipar o nevoeiro cerrado que se criou em torno da Caixa. Prova disso é o facto de a instituição se recusar a entregar à CPI uma lista dos maiores créditos por si concedidos, apesar de uma decisão do Tribunal da Relação de Lisboa ter decretado o levantamento do dever de segredo à CGD. 
“A documentação pedida, além de ainda não estar aprovada na sua totalidade, contém informação relativa a clientes e também informação que, embora respeitando à vida interna da CGD, atenta a sua natureza e sensibilidade, se impõe manter em segredo, para preservação dos seus legítimos interesses, no quadro plenamente concorrencial em que desenvolve a sua actividade”, argumenta o banco numa carta assinada por Rui Vilar e João Maria Tudela.
Outro senão. Relevante. A CGD, com este argumento, não parece inclinada em defender também os “legítimos interesses” dos contribuintes, que vão ter de suportar o aumento de capital do banco e compreender que existe um “segredo” superior que os impede de saber o porquê. É comer e calar. Este jogo de sombras é chocante.
Não nos tomem por tolos, por favor. 
Fonte: Jornaldenegocios